23 de novembro de 2011

Em Londrina, 62% dos partos são cesarianas.

Índice local de partos cirúrgicos ultrapassa a média brasileira, já considerada alta.

Paulo Briguet

No Brasil, o normal já é a cesariana. Em 2010, pela primeira vez, o número de partos cirúrgicos (52%) ultrapassou o de partos normais (48%). Em Londrina, a diferença é maior: no ano passado, as maternidades locais registraram 2.629 partos normais (38%) e 4.289 cesarianas (62%). A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o índice de cesarianas não seja maior do que 15%. E já tem gente no Ministério da Saúde brasileiro falando em “epidemia” de cesáreas.

A médica Lilian Carolaine Vaccari, vice-presidente da Sociedade Paranaense de Ginecologia e professora da UEL, diz que a situação – no Brasil e em Londrina – se deve à combinação de alguns fatores. “As pessoas se acostumaram à ideia de que quem podia pagar ia para a cesariana; quem não podia, ia para o parto normal”, afirma a ginecologista. “Na Europa e nos EUA, isso não acontece: a mulher sabe, ao engravidar, que a tendência é realizar um parto normal.”

Mitos

A questão cultural faz aumentar o número de cesáreas. Mesmo com as modernas técnicas de analgesia acessíveis a todos – inclusive pacientes do SUS –, a mulher brasileira ainda associa parto normal a sofrimento. Disso decorrem alguns mitos, segundo Lilian Vaccari: o de que o sofrimento materno leva ao sofrimento fetal; e o de que há mais complicações para os bebês no parto normal. “Isso não é verdade. O parto normal melhora as condições de nascimento do bebê. A mãe não precisa fazer repouso cirúrgico nem ficar separada do filho.”

Mas os fatores tempo e remuneração profissional não podem ser esquecidos quando se fala no assunto. “Muitos médicos não se sentem confortáveis em seguir um trabalho de parto que pode durar muitas horas”, diz a médica. “O parto normal requer tempo, algo que o médico não tem hoje em dia. E o tempo não é remunerado adequadamente pela maioria dos planos de saúde.” O SUS paga R$ 30 por uma cesárea e R$ 80 por um parto normal. Ocorre que a cesárea pode durar meia hora; e o parto natural, até mais de 12 horas.

O presidente da Associação Médica de Londrina, Antônio Caetano de Paula, observa que a cidade é uma referência regional em obstetrícia. “Muitas pacientes vêm de outras cidades e acabam encaminhadas para atendimento obstétrico de urgência em hospitais terciários. Isso faz aumentar o número de cesarianas em Londrina.”


Ginecologista, Caetano de Paula ressalta que os médicos em geral optam por seguir a decisão das gestantes. “A mulher muitas vezes prefere a cesárea, por uma questão de conforto e para não sentir dor. Eu respeito essa decisão – o que é determinado pelo nosso código de ética.”

Segundo o médico, os dois procedimentos têm vantagens e desvantagens; é preciso seguir a lógica e o bom senso na hora de escolher entre o método natural e a cirurgia. “Não se pode marcar uma cesariana porque o médico vai viajar ou porque a família escolheu uma data especial para o nascimento. Estamos lidando com a vida.” O mais importante, segundo Antônio Caetano de Paula, é que a paciente se sinta informada e segura para tomar uma decisão. “A mãe deve seguir o que ela deseja, não o que a família exige ou o governo quer.”

A atriz Pâmela Beatriz Nogueira, 29 anos, mãe de duas crianças, queria muito fazer o parto normal, mas não conseguiu. Aos 22 anos, quando ficou grávida pela primeira vez, ela foi para a cesariana após nove horas de trabalho de parto. “Naquela época eu não tinha tantas informações, mas hoje tenho certeza de que fui induzida a fazer a cesárea. Me deixaram com medo.” Ao engravidar pela segunda vez, há dois anos, Pâmela disse ao médico que queria o parto normal. A resposta foi a seguinte: “Você vai insistir nessa loucura?” Diante disso, a atriz resolveu mudar de obstetra. Mas a segunda gestação teve uma série de complicações, e o parto normal não pôde acontecer. Depois de participar do grupo GestaLondrina – que dá apoio a mulheres grávidas na cidade – Pâmela se tornou uma defensora convicta do parto normal e da amamentação. O filho mais novo, de um ano e meio, ainda mama no peito. “Só ficou essa tristeza de não fazer o parto normal. Não é nenhuma loucura, é um parto mais humanizado".

http://www.jornaldelondrina.com.br/online/conteudo.phtml?tl=1&id=1195089&tit=Em-Londrina-62-dos-partos-sao-cesarianas

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